terça-feira, 3 de março de 2015

CAPÍTULO V

CAPÍTULO V
  
  
  
  


    O Príncipe Siddhatta tinha um forte desejo de sair dos limites do palácio e conhecer o verdadeiro modo de vida de seu povo. Seu pai, o Rei, providenciou-lhe uma carruagem puxada pelos cavalos reais. Por onde quer que passasse, via somente fachadas enfeitadas e vistas prazerosas, pois tudo no reino havia sido decorado, limpo e perfumado por ordem do Rei. Tudo era de encher os olhos, até as roupas das pessoas. A carruagem era dirigida pelo seu atendente pessoal dileto, Channa, e, ao passarem pelas ruas, eles viram um homem idoso, um homem doente, uma pessoa morta e um asceta, à despeito dos arranjos do rei. Vendo o homem idoso, o Príncipe ficou muito triste, perguntando-se porque ele era tão fraco e encurvado. Tinha a face pálida e enrugada. O Príncipe inquiriu a Channa, e este explicou que a beleza e a saúde do homem se haviam extinguido, e que agora era um homem de idade: não tinha a força e o ânimo de um jovem. 
O Rei Suddhodana criou o Príncipe mantendo-o confinado nos palácios tendo raríssimos contatos com o mundo externo. Dada a proteção exagerada, Sua primeira experiência fora dos muros do palácio foi notável, e o que viu durante aquele passeio marcou-O de forma indelével. Todos os prazeres do palácio não tinham mais graça diante do que havia presenciado! Decidiu sair mais vezes... 

Outra vez, Ele e Channa saem do palácio, e não demorou muito para que Ele visse uma pessoa doente, com severas dores no corpo, Siddhattha custou a crer que uma pessoa pudesse sofrer tanto. Na primeira saída, Ele ficara pesaroso por causa do homem idoso. Seu pesar aumentou devido à visão da pessoa doente. "Ele era forte e tinha saúde. Agora a doença tomou conta de seu corpo. Nós também estamos sujeitos às mesmas condições", explicou Channa. O Príncipe ficou muito entristecido e pediu a Channa para retomar depressa para o palácio. 

Noutra vez, Ele ficou chocado com a visão de um corpo morto, carregado por quatro pessoas. Era a primeira vez que via um cadáver. Ele pensou em como a vida é ameaçada pela morte e questionou Channa: "Como ele está morto?". Channa explicou: "O corpo não tem mais consciência. Ele não pode mais falar ou andar. Quando um corpo está sem vida, é dito morto. Ele tinha vida como nós até que morreu. Era feliz e ativo enquanto vivo. Seus parentes e amigos choram agora, carregam coroas de flores a fim de honrar sua memória". 

O Príncipe então percebeu por fim como é a vida neste mundo, com todas as suas características. Desta forma, Ele apreendeu um mundo cheio de sofrimento. Pessoas nascem e estão sujeitas ao envelhecimento, decadência, doença e morte. Por isto, Ele foi motivado a encontrar a verdadeira essência da vida, ao mesmo tempo que se conscientizava de que a Compaixão e a Sabedoria são coisas tangíveis e verdadeiras. Por fim, Ele tomou a firme decisão de acabar com o sofrimento e trazer felicidade a todos os seres do mundo. 

Passou noites sem sono, relembrando tudo o que vira nos passeios. Por sorte, o Príncipe havia se entusiasmado com a figura calma do asceta errante, que igualmente vira. Esta lembrança trouxe tranqüilidade à Sua mente. Decidiu ir ter com o asceta para conversar. O asceta estava passando os dias sob a árvore jambu. O Príncipe discutiu tudo o que vira com os asceta, calmamente. Influenciado pela figura do asceta, pensou que uma paz duradoura estava disponível para aquele que se tomasse asceta, e renunciasse ao mundo (5). Decidiu tomar-se asceta, a fim de encontrar um caminho que levasse à cessação do sofrimento. Resolveu deixar para trás reino, esposa filho, pai, companheiros, dignatários e outros membros da corte, para descobrir a Verdade por Si mesmo. Ele sabia que Seu pai havia feito sempre tudo para afastá-Lo das dificuldades da vida, e que era contrário a Sua nova decisão. Teria que partir escondido. 

Assim, Ele resolveu partir na mesma noite de Sua decisão, e decidiu que não retomaria ao palácio sem antes haver descoberto as respostas, e houvesse descoberto o caminho para uma paz duradoura. Fez isto, porque no palácio não poderia jamais se dedicar ao Seu intento. Pediu a Channa para selar Seu cavalo favorito, Kanthaka, preparando-se para esta longa jornada que se descortinava ante Sua Vida. Sairia nas primeiras horas da manhã. O Príncipe não esqueceu de olhar Seu pequeno filho recém-nascido, e a Princesa Yasodhara, que dormiam no quarto. O bebê dormia nos braços da mãe, quando Gautama entrou no quarto. Desejou beijá-la, mas assim acordaria a ambos. Permaneceu em silêncio por uns instantes, sentindo Seu coração pesar. O Príncipe estava agora nas escadarias do palácio, acompanhado apenas de Seu atendente Channa. Pegou Kanthaka e montou-o, dirigindo-se para os portões do palácio, que se abriram de par em par. O Príncipe e Channa cavalgaram juntos manhã a dentro, sem destino, em silente tristeza.

  
  
  

 NOTAS

  (1) -  Período de Lua Cheia. 
(2) -  Termo de origem indiana, que indica as classes de seres espirituais em geral; por "div" luz. 
(3) -  Devido à consciência altamente desenvolvida em vidas anteriores, o Bodhisatta Gotama pôde ainda por um breve momento falar e andar, mesmo em corpo de bebê, antes que as forças materiais sobrepujassem Sua consciência. 
(4) -  Um costume do oriente antigo era arranjar casamento para os filhos, sem a opinião ou desejo deles. Este costume vem perdendo força, mas ainda perdura na Índia. 
(5) -  Renúncia tem dois aspectos e é muito incompreendida. Renúncia significa não-apego, não-ligação, e não significa que se deve largar tudo. É um estado interior que se reflete exteriormente. A decisão do Buddha parece extrema para muitos, mas temos de levar em conta o ambiente histórico e social da Índia, quando era comum muitos saírem de casa para levar uma vida ascética ou religiosa. Mas Buddha sabia, e nós também, que a vida caseira tem muitos envolvimentos e toma muito tempo. Ainda mais Ele, que era um Príncipe e sucessor do trono de seu Pai. 


Nenhum comentário:

Postar um comentário